A última carta - Moço do quarto azul

Alguma cidade, algum dia de algum mês de algum ano

          Querido J.,

       “Fiz fantasias. No meu demente exercício para pisar no real, finjo que não fantasio. E fantasio, fantasio.”
Ler o Caio é meu desafogo. Nunca me identifiquei tanto com alguém. Lamento por ele ser gay e morto. Insisto que seríamos grandes amigos e eu estaria muito apaixonada.
              Tu é diferente. Não é só diferente da maioria, é diferente de todos.
Hoje é apenas um dia igual aos outros. Penso em você, é claro que penso em você. Espero que meu telefone toque e sua voz grave me convide para um encontro, assim, como quem não quer nada. Então, transaríamos e nos despediríamos em minha porta. É desse jeito que as coisas funcionavam. Se essas migalhas são o máximo que você pode me dar, eu quero, mesmo assim, me nutrir delas.
“Mas, por favor, não fantasie, menina, não seja demasiado adolescente.”
Sonho com suas mãos passeando pelas minhas coxas, brincando com meus seios, massageando meu clitóris. Lembro-me das vezes em que eu, no auge da minha safadeza, levava minha boca ao encontro do seu pênis másculo. Sorvia vagarosamente o delicioso sabor de pecado que tinha sua pele. Você me beijava, me apertava e enfiava dedos em mim. Eu ficava louca de tesão. Quantas saudades sinto, coisinha cintilante, quantas saudades!
“Uma vez me disseram que eu jamais amaria dum jeito que “desse certo”, caso contrário, deixaria de escrever. Mas meu coração está ferido de amar errado.”
Eu acreditei, sinceramente, que daria certo, que nós estaríamos juntos para sempre. Pensei que meu jeito idiota, meu olhar sexy de míope e meus gemidos escandalosos de prazer não deixariam você ir embora. Triste engano. Hoje eu percebi que o que inicia com "era uma vez" nem sempre termina com "felizes para sempre". 
              “Você se foi e eu afundei numa melancolia de dar gosto.”
São apenas algumas horas, mas sinto como se fossem anos. O tempo passa e aquele nó permanece em minha garganta. Maldito seja Cronos, que deveria se empenhar em curar minhas dores em vez de aumentá-las.
              Vem, antes que eu me vá, antes que seja tarde demais. Vem, que eu não tenho ninguém e te quero junto a mim. Vem, que eu te ensinarei a voar.
Dói na alma saber que é o fim. A cada segundo que passo longe de você uma nova ferida abre em meu peito. Confesso que não vou te esquecer. Talvez meu amor resolva se concentrar em outra pessoa e eu me apaixone novamente. Mas você sempre estará aqui. Sempre haverá um espaço em meu coração. Eu te quero, te quero muito, moço do quarto azul. 
Lastimavelmente sua, 

                Fernanda Sales

Ps.: Amo-te. E creio que esse amor te ofende.