Felicidade à venda

       E depois de um longo dia de trabalho, sustentando com meu suor esse sistema injusto, na tentativa de garantir as migalhas daquilo que produzo, chego em casa e atiro-me no sofá. Com o controle, ligo a caixa de Pandora à minha frente e deixo que aquelas imagens coloridas tomem minha mente.
       A primeira cena que vejo é de uma família feliz, em perfeita harmonia. Todos estão sorrindo e até o cão labrador parece estar entusiasmado. Eles se sentam à mesa arrumada e repleta de coisas gostosas e lentamente se servem de uma torrada lambuzada com margarina. Uma frase de efeito e mais alguns sorrisos depois, a propaganda acaba. Nada, nos últimos anos, conseguiu me deixar tão deprimida como este espetáculo de poucos segundos.
      Minha família nunca esteve tão alegre quanto aquela do comercial. Para falar a verdade, nós nem fazemos as refeições nos mesmos horários. Não possuímos nenhum cão e nossa mesa não tem aquele bolo de chocolate convidativo. Não trocamos sorrisos e abraços, estamos ocupados demais tentando ganhar dinheiro para que aquela mesma margarina esteja em nossa despensa. 
       Então pergunto-me, onde está essa felicidade que vocês vendem, Delícia, Qualy, Doriana, Mila [...]? Será que está na proteção metalizada que jogo fora? Será que está na embalagem e eu ainda não encontrei, embora tenha procurado por horas? Será que está no gosto e eu ainda não percebi? Será que eu também tenho que comprar aquela torrada para  surtir o efeito? Ou será que vocês simplesmente deveriam parar de dizer que a melhor coisa do mundo é digerir um pouco de gordura colocada em um pote?
       Estou falando apenas de 500 gramas de óleo vegetal hidrogenado que está no meu armário, mas o problema é muito maior. Se esse pensamento de que o consumo atende às demandas do espírito humano está presente em coisas tão ínfimas, o que pensar do resto? Até onde vai essa comercialização da ilusão? Até onde deixaremos ir essa comercialização da ilusão?
       Lembrem-se, amigos, a nossa felicidade depende mais do que temos nas nossas cabeças, do que nos nossos bolsos, ou, neste caso, no vaso de margarina.
    
       Fernanda Schopenhauer Salles

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Fernanda, a Sales